Correio de Carajás

Marabá tem programação voltada à visibilidade Trans

Segue até o próximo dia 31 a Semana da Visibilidade Trans, lembrado em todo o país e com programação especial em Marabá na próxima segunda-feira, dia 29. Às 8h30 acontecerá a abertura, no Centro de Referência de Assistência Social (CREAS), do Fórum de Diversidade Sexual e Gênero Municipal e Histórico da Luta Trans no movimento LGBT.

Às 9h30 acontece um cine-debate, com os temas “Sou TRANS e (R)Existo” e “BlasFêmea (Linn da Quebrada)”. Após um intervalo, às 10h30, é realizado o espaço auto-organizado. À tarde, entre 14h30 e 17 horas, haverá expedição da Carteira de Nome Social, além de testagem rápida para HIV e outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs).

Na manhã de hoje, quarta-feira (24), o programa “Correio Notícias”, da Rádio Correio FM (92,1), apresentado por Milton Faria, promoveu um debate ao vivo sobre o assunto, com participação das trans Melissandra da 28, dos jornalistas Sebastina Netto e Tayana Marquioro e do responsável pela emissora, Jairon Gomes.

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“O mundo não se divide só entre homem e mulher heterossexuais e pessoas homoafetivas. Existem mais de 56 nomenclaturas listadas e popularizadas sobre identidade de gênero”, iniciou a jornalista Tay Marquioro, detalhando alguns exemplos.

Neste contexto, é importante destacar que sexo, identidade de gênero e orientação sexual são condições diferentes entre si e em muitos casos fogem daquilo que é tradicionalmente aceito na sociedade: uma pessoa que nasce com sexo masculino, se identifica enquanto homem e é heterossexual, por exemplo.

Uma explicação resumida definiria o sexo biológico como combinação dos cromossomos de uma pessoa com a genitália, ou seja, macho, fêmea ou intersexual, no caso uma variação de caracteres sexuais – incluindo cromossomos, gônadas e/ou órgãos genitais – que dificultam a identificação de um indivíduo como totalmente feminino ou masculino.

A identidade de gênero – defendida pelas teorias Queer e feministas –  diz respeito à construção social e cultural de identidade enquanto gênero homem e mulher, por meio de relações de poder. Para além do binarismo “homem” e “mulher”, existem ainda as pessoas que se identificam com mais de um gênero, como as transgêneros, com gênero fluído, drag queens, e o genderqueer.

Por fim, a orientação sexual diz respeito à inclinação afetiva, por qual gênero ou sexo aquela pessoa se atrai. Nessa conta entram os heterossexuais, homossexuais, bissexuais e mesmo orientações mais invisibilizada, tais como assexuais e pansexuais.  

Tratando sobre a questão de invisibilidade trans, a jornalista Tayana destacou que essas pessoas não apareceram “do nada”, como muita gente atualmente pensa. “Não vieram depois do fim ditadura com muita gente diz. Hoje a gente fala muito mais em homofobia e preconceito porque hoje os gays se mostram muito mais, tanto gays, quanto lésbicas, trans, travestis, enfim. Os gays se mostram muito mais e até por eles se mostrarem muito mais, se exporem muito mais também. E estão muito mais suscetíveis a sofrer violência”, afirma, acrescentando que não há outra palavra equivalente à homofobia que violência, seja ela física ou verbal.

Jairon Gomes ressaltou que se existe luta pela visibilidade trans hoje é porque estas pessoas foram durante muito tempo invisibilizadas. “Quer dizer que esta pessoa estava na escola, mas ninguém prestava atenção. Ou então quando a pessoa está em família ou tá lá na reunião do trabalho e se pergunta ‘quando que você vai casar?’. Você tá invisibilizando a sexualidade da pessoa. Conseguimos avançar muito com a visibilidade homoafetiva, a questão do gay e da lésbica, mas a gente precisa avançar com a visibilidade trans. A gente precisa dessas pessoas ingressando no mercado de trabalho, a gente precisa delas na faculdade. Tem um leque muito grande dentro da questão trans”, diz, ressaltando a questão de crianças trans e pessoas da terceira idade. “Temos o caso da Laerte, grande cartunista, cujo processo de mudança de sexo veio já na terceira idade ou já na maturidade”.

#ANUNCIO

EXPERIÊNCIA

Sobre a questão, Melissandra relembra como enfrentou o preconceito quando ainda era criança. “Quando estamos falando de condições LGBT não estamos falando de uma escolha, mas de uma condição de nascimento, não nos tornamos LGBT com o passar do tempo, nós nos reconhecemos enquanto LGBT. Então a sociedade, desde que somos pequenos, nos ensina um padrão cis-normativo (onde sexo, orientação sexual e identidade de gênero estão alinhados), nos ensina o que é ser homem e o que é ser mulher. Nos ensina que homem tem que gostar disso e mulher daquilo, mas enquanto crianças nos sentimos muito perdidos em meio a essa construção. Eu, com quatro anos, não me reconhecia enquanto homem em frente ao espelho, não encontrava essa figura masculina”, diz.

Sobre a relação com a família, ela diz que sofreu violências por não se encaixar no padrão. “São pessoas que nós estamos construindo e a gente quer construir elas moldando os corpos delas em um padrão engessado, mas os nossos corpos não são engessados, são plásticos, mutáveisou adaptáveis. (…) eu passei por tratamentos médicos, passei por sessões, apanhei muito pra poder ‘virar um homem’, sabe? Mas desde sempre a minha afinidade sempre foi por vestimentas femininas, sempre foi por maquiagem.

Sebastião relembra que o Brasil é o país que mais mata pessoas trans do mundo. “A gente ganha quatro vezes do segundo lugar, que é o México. Todos os dias uma pessoa trans morre. E a gente morre psicologicamente porque a gente não consegue usar um banheiro, porque ‘ah, não, você é homem’. Tem sempre um fiscal para dizer qual o gênero que tem que ser imposto. A gente morre porque pra viver numa sociedade, com mínimo de dignidade, precisamos de um trabalho, de uma carreira, o que não está tendo”, destaca.

MERCADO DE TRABALHO

A falta de oportunidade no mercado de trabalho acaba empurrando os transexuais e travestis para a prostituição, expondo essas pessoas a riscos constantes. “Na verdade, a gente pode considerar que a prostituição é como uma segunda jornada de trabalho na vida do travesti. Durante à noite tá ganhando o pão dela, mas durante o dia vai estar estudando ou fazendo outras coisas. O mercado de trabalho é transfóbico, muito transfóbico. Nós vivemos num país que não tem mercado de trabalho para travestis, principalmente aqui no Norte do Brasil”, afirma Melissandra.

Neste contexto, Sebastian diz que os meios de comunicação têm colaborado com essas pessoas, dando maior visibilidade. “Eles vêm com uma proposta de visibilizar esses corpos. Com a semana de visibilidade, inclusive. Porque antes você só via mulheres travestis na rua, se prostituindo porque não consegue estudar, seja pela chacota no Ensino Médio, a chacota na família, a família expulsando muito cedo de casa.  Então quando a menina se assume travesti, ela vai vender o corpo dela nas noites, mas agora a gente ta podendo ver na TV, em alguns programas, essa visibilidade das mulheres travestis, como na música com Linn da Quebrada, por exemplo”.

Essa exposição, no entanto, ainda necessita de ajustes, ressalta. “A preocupação é com os transfakes. Muita gente peca ao chamar pessoas héteros, cis normativas, para atuarem em papéis de trans. Deveria haver um garimpo maior, chamar essas meninas que estão estudando teatro, que existem, que estão na noite se prostituindo, mas são mulheres que podem desenvolver um trabalho mais real, levar uma mensagem mais real. Há uma grande preocupação aí entre o caricato e o destino oficial dessas pessoas, ou seja, você só pode ser garota de programa, você só pode ser prostituta”, finaliza. (Luciana Marschall)

Segue até o próximo dia 31 a Semana da Visibilidade Trans, lembrado em todo o país e com programação especial em Marabá na próxima segunda-feira, dia 29. Às 8h30 acontecerá a abertura, no Centro de Referência de Assistência Social (CREAS), do Fórum de Diversidade Sexual e Gênero Municipal e Histórico da Luta Trans no movimento LGBT.

Às 9h30 acontece um cine-debate, com os temas “Sou TRANS e (R)Existo” e “BlasFêmea (Linn da Quebrada)”. Após um intervalo, às 10h30, é realizado o espaço auto-organizado. À tarde, entre 14h30 e 17 horas, haverá expedição da Carteira de Nome Social, além de testagem rápida para HIV e outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs).

Na manhã de hoje, quarta-feira (24), o programa “Correio Notícias”, da Rádio Correio FM (92,1), apresentado por Milton Faria, promoveu um debate ao vivo sobre o assunto, com participação das trans Melissandra da 28, dos jornalistas Sebastina Netto e Tayana Marquioro e do responsável pela emissora, Jairon Gomes.

“O mundo não se divide só entre homem e mulher heterossexuais e pessoas homoafetivas. Existem mais de 56 nomenclaturas listadas e popularizadas sobre identidade de gênero”, iniciou a jornalista Tay Marquioro, detalhando alguns exemplos.

Neste contexto, é importante destacar que sexo, identidade de gênero e orientação sexual são condições diferentes entre si e em muitos casos fogem daquilo que é tradicionalmente aceito na sociedade: uma pessoa que nasce com sexo masculino, se identifica enquanto homem e é heterossexual, por exemplo.

Uma explicação resumida definiria o sexo biológico como combinação dos cromossomos de uma pessoa com a genitália, ou seja, macho, fêmea ou intersexual, no caso uma variação de caracteres sexuais – incluindo cromossomos, gônadas e/ou órgãos genitais – que dificultam a identificação de um indivíduo como totalmente feminino ou masculino.

A identidade de gênero – defendida pelas teorias Queer e feministas –  diz respeito à construção social e cultural de identidade enquanto gênero homem e mulher, por meio de relações de poder. Para além do binarismo “homem” e “mulher”, existem ainda as pessoas que se identificam com mais de um gênero, como as transgêneros, com gênero fluído, drag queens, e o genderqueer.

Por fim, a orientação sexual diz respeito à inclinação afetiva, por qual gênero ou sexo aquela pessoa se atrai. Nessa conta entram os heterossexuais, homossexuais, bissexuais e mesmo orientações mais invisibilizada, tais como assexuais e pansexuais.  

Tratando sobre a questão de invisibilidade trans, a jornalista Tayana destacou que essas pessoas não apareceram “do nada”, como muita gente atualmente pensa. “Não vieram depois do fim ditadura com muita gente diz. Hoje a gente fala muito mais em homofobia e preconceito porque hoje os gays se mostram muito mais, tanto gays, quanto lésbicas, trans, travestis, enfim. Os gays se mostram muito mais e até por eles se mostrarem muito mais, se exporem muito mais também. E estão muito mais suscetíveis a sofrer violência”, afirma, acrescentando que não há outra palavra equivalente à homofobia que violência, seja ela física ou verbal.

Jairon Gomes ressaltou que se existe luta pela visibilidade trans hoje é porque estas pessoas foram durante muito tempo invisibilizadas. “Quer dizer que esta pessoa estava na escola, mas ninguém prestava atenção. Ou então quando a pessoa está em família ou tá lá na reunião do trabalho e se pergunta ‘quando que você vai casar?’. Você tá invisibilizando a sexualidade da pessoa. Conseguimos avançar muito com a visibilidade homoafetiva, a questão do gay e da lésbica, mas a gente precisa avançar com a visibilidade trans. A gente precisa dessas pessoas ingressando no mercado de trabalho, a gente precisa delas na faculdade. Tem um leque muito grande dentro da questão trans”, diz, ressaltando a questão de crianças trans e pessoas da terceira idade. “Temos o caso da Laerte, grande cartunista, cujo processo de mudança de sexo veio já na terceira idade ou já na maturidade”.

#ANUNCIO

EXPERIÊNCIA

Sobre a questão, Melissandra relembra como enfrentou o preconceito quando ainda era criança. “Quando estamos falando de condições LGBT não estamos falando de uma escolha, mas de uma condição de nascimento, não nos tornamos LGBT com o passar do tempo, nós nos reconhecemos enquanto LGBT. Então a sociedade, desde que somos pequenos, nos ensina um padrão cis-normativo (onde sexo, orientação sexual e identidade de gênero estão alinhados), nos ensina o que é ser homem e o que é ser mulher. Nos ensina que homem tem que gostar disso e mulher daquilo, mas enquanto crianças nos sentimos muito perdidos em meio a essa construção. Eu, com quatro anos, não me reconhecia enquanto homem em frente ao espelho, não encontrava essa figura masculina”, diz.

Sobre a relação com a família, ela diz que sofreu violências por não se encaixar no padrão. “São pessoas que nós estamos construindo e a gente quer construir elas moldando os corpos delas em um padrão engessado, mas os nossos corpos não são engessados, são plásticos, mutáveisou adaptáveis. (…) eu passei por tratamentos médicos, passei por sessões, apanhei muito pra poder ‘virar um homem’, sabe? Mas desde sempre a minha afinidade sempre foi por vestimentas femininas, sempre foi por maquiagem.

Sebastião relembra que o Brasil é o país que mais mata pessoas trans do mundo. “A gente ganha quatro vezes do segundo lugar, que é o México. Todos os dias uma pessoa trans morre. E a gente morre psicologicamente porque a gente não consegue usar um banheiro, porque ‘ah, não, você é homem’. Tem sempre um fiscal para dizer qual o gênero que tem que ser imposto. A gente morre porque pra viver numa sociedade, com mínimo de dignidade, precisamos de um trabalho, de uma carreira, o que não está tendo”, destaca.

MERCADO DE TRABALHO

A falta de oportunidade no mercado de trabalho acaba empurrando os transexuais e travestis para a prostituição, expondo essas pessoas a riscos constantes. “Na verdade, a gente pode considerar que a prostituição é como uma segunda jornada de trabalho na vida do travesti. Durante à noite tá ganhando o pão dela, mas durante o dia vai estar estudando ou fazendo outras coisas. O mercado de trabalho é transfóbico, muito transfóbico. Nós vivemos num país que não tem mercado de trabalho para travestis, principalmente aqui no Norte do Brasil”, afirma Melissandra.

Neste contexto, Sebastian diz que os meios de comunicação têm colaborado com essas pessoas, dando maior visibilidade. “Eles vêm com uma proposta de visibilizar esses corpos. Com a semana de visibilidade, inclusive. Porque antes você só via mulheres travestis na rua, se prostituindo porque não consegue estudar, seja pela chacota no Ensino Médio, a chacota na família, a família expulsando muito cedo de casa.  Então quando a menina se assume travesti, ela vai vender o corpo dela nas noites, mas agora a gente ta podendo ver na TV, em alguns programas, essa visibilidade das mulheres travestis, como na música com Linn da Quebrada, por exemplo”.

Essa exposição, no entanto, ainda necessita de ajustes, ressalta. “A preocupação é com os transfakes. Muita gente peca ao chamar pessoas héteros, cis normativas, para atuarem em papéis de trans. Deveria haver um garimpo maior, chamar essas meninas que estão estudando teatro, que existem, que estão na noite se prostituindo, mas são mulheres que podem desenvolver um trabalho mais real, levar uma mensagem mais real. Há uma grande preocupação aí entre o caricato e o destino oficial dessas pessoas, ou seja, você só pode ser garota de programa, você só pode ser prostituta”, finaliza. (Luciana Marschall)